quinta-feira, 10 de maio de 2012

Pêlo Escuro

CULTURA E RESISTÊNCIA

Cantar Charqueada

Até eu cantei charqueada
chorando a sorte do boi.

Mas descobri que meu canto
tem raízes noutro campo:
por trás das cancelas mudas,
por trás das facas agudas.

Meu canto é uma carne escura
charqueada a relho na nalga;
é figura seminua
junto às gamelas de salga.

Carne escura exposta ao vento
dos varais do saladeiro
exposta viva ao sol quente
e suas facas carneadeiras.

Carne que se compra e vende
e de bem longe se importa
se salga, seca e só perde
quando já é carne morta

E meu canto é dessa carne
que não é minha e me dói
sangrando no sol da tarde
de um tempo que enfim se foi

Cabe a mim cantar charqueada
chorando a sorte do boi?

Oliveira Silveira
Pêlo Escuro

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